Eddie Vedder - Hard Sun
*Foto de Christopher Johnson McCandless - O filme Into the Wild foi inspirado em sua vida
A bomba veio e despedaçou cada pedaço de pele com violência inflamada. Era o fim. Explosões foram noticiadas em todas as cidades do mundo e toda a humanidade fora extinta.
Ninguém esperava por isso, estavam todos confortáveis em suas salas, em suas cozinhas preparando a próxima refeição com a tv ligada. Absolutamente nada no mundo deveria ser tão injusto assim.
Alguns meses antes, uma curva provocou uma minúscula mudança em tamanha tragédia. Um garoto de uma cidade pequena foi aos meios de comunicação e informou que o fim chegaria a todos. Vidência? Sabedoria precoce? Loucura? Ninguém sabia. Ciente de que não seria facilmente ouvido, o menino (de uns 13 anos), escreveu um texto com o título: "É proibido ser infeliz, pois o fim vem". Ele imprimiu milhares de cópias desse texto e passou a espalhar os papéis pela cidade, que ficou salpicada de branco. O texto narrava sobre o fim inevitável e das formas de escape, que seriam inúteis, mas que ainda assim poderiam fazer do fim algo menos traumático. Uma vida com sentido, afinal.
Poucos leram, pois diziam que era óbvio demais, que todos sabiam disto, que se tratava de marketing de auto ajuda, que estavam conscientes e que o silêncio deles era pura negação.
Uma garota, que estava sentada em um café lendo seu livro, se assustou quando o papel do texto voou em sua direção (mais precisamente no seu rosto), e ficou um tanto atordoada por ter sido retirada de sua história tão bruscamente. Resolveu lê-lo. Ao terminar de ler teve um insight, levantou a cabeça e observou que todas as pessoas na rua traziam consigo algo perturbadoramente comum: Uns andavam rapidamente em direções desconhecidas, outros andavam mexendo nos celulares, uns poucos se alimentavam sentados olhando para o nada, outros passeavam com os cães... O similar era que todos, sem exceção, pareciam estar em um estranho transe. Percebeu que se quisesse chamar a atenção deles teria que gritar, alguns tomariam susto e outros nem a ouviriam. No que pensavam? Cada um estava imerso em seu universo mental/paralelo tão fixamente, que pareciam enfeitiçados, ela também estaria se não tivesse sido despertada. "Corremos, corremos e corremos para a mesma direção, fazendo tudo igual aos nossos pais, seguindo o mesmo modelo de felicidade de todos." - pensou.
A garota se viu como um deles, se identificou alienada.
Foi pra casa e decidiu traçar uma rota de fuga acima das montanhas, muito longe de casa. Seguiu o que o texto dizia, seria feliz antes do fim, e pra ela o fim perfeito seria perto de sua montanha predileta. O fim vem, e por isso, eu vou.
Enquanto isso, todos continuavam cozinhando, trabalhando em empregos que detestavam - ou não, sendo felizes com suas escolhas ou projetando-as para o futuro: "Quando eu comprar aquela casa serei feliz".
"Todos fazem escolhas até quando se negam a isso, pois optam por não escolher. Não escolher é também uma escolha." Afirmou a si mesma, se referindo a como agiu durante toda a sua vida.
Na contramão de seus pares, resolveu vender tudo e juntar uma quantia razoável para fugir sozinha para a tal montanha. Quando falou de seus planos para os outros só ouviu sobre como não daria certo, de que o fim demoraria, que se não desse certo na montanha ela teria que voltar, que precisaria de uma casa ao voltar, de que iria sofrer longe de seus conhecidos, que era perda de tempo, que era imatura. Resumindo, ouviu que o melhor a fazer era se aninhar no conhecido para ter uma velhice tranquila.
Só que não entendiam que não há tranquilidade no fim e que esse fim virá criativamente para cada indivíduo na terra, para uns cedo demais, para outros muito tarde e na esmagadora maioria das vezes seria uma incógnita. A garota sabia que precisaria tentar, ao invés de permanecer esperando o momento em que descansaria em seu casarão/caixão.
Conseguiu após algum tempo partir para a montanha, seu universo predileto no mundo, e sentiu que ao fazer a escolha que se deseja, independente da opinião dos outros, é libertador.
E o fim veio para todos como anunciado: para os que estavam em suas casas, para os que estavam sentados no sofá, para os que trabalhavam, para aqueles que só usavam perfumes bons em festas especiais, para o menino que escreveu o texto, para aqueles que prometiam que era a última dose, para os que se achavam velhos, para os que se achavam feios, para os que não acreditavam em si mesmos e resolveram desistir de suas escolhas, para o rapaz apaixonado que não insistiu no romance por puro orgulho, para a mulher que só se envolvia por dinheiro, pro pai que abandonou o seu filho, para os internados nos hospitais, para os "bons", para os "maus"...
E também para a garota, que estava sentada na montanha de olhos fechados, no exato momento que a bomba explodiu. O fim alcançou a todos, os felizes e infelizes seres viventes desta terra, e nunca, nunca mais estes poderiam retornar ao ponto anterior disto, estava de fato tudo acabado.
Alguns diriam que suas vidas foram vividas da melhor e mais completa forma possível, mas infelizmente nem todos podiam dizer o mesmo.
O mundo inteiro se esvai (em um segundo e bruscamente), quando nós, platéia única e individual do mundo inteiro, nos vamos. Você carrega e é, o seu/nosso mundo inteiro.